O rompimento das relações e o turnover
O que levar em consideração para diminuir o turnover no mercado publicitário brasileiro
Por Letícia Fiaschi e Flaviz Guerra*
Trabalhar em agências de publicidade é fascinante e tem um grande apelo criativo, além de gerar interesse dos universitários pelo seu dinamismo e constante evolução. Essa dinâmica acelerada e em constante mudança exige muita dedicação (sim, horas e horas de trabalho) dos profissionais que atuam no meio. No entanto, essa dedicação pode passar dos limites do profissional e não ser recompensada de maneira que faça a pessoa sentir-se plenamente satisfeita. Se isso acontecer, o sentimento de frustração entre o esforço dedicado versus a recompensa oferecida leva à ruptura nas relações entre as duas partes. Esse é o momento do rompimento da relação entre o profissional e a agência de publicidade e, com isso, começa o ciclo de rotatividade. Entende-se por rotatividade: um índice frio, temido, mensurável e comumente conhecido no Departamento Pessoal das agências como turnover.
Infelizmente, o mercado publicitário tem apresentado ano após ano altas taxas desse índice. A tendência também se agrava com o cenário brasileiro pós-pandemia. Aqui no Brasil, a rotatividade aumentou 56% em relação ao período pré-pandemia, segundo o estudo publicado pela Robert Half.
Não há uma ciência exata para avaliar o que vai equilibrar o nível da dedicação da pessoa no seu trabalho e sua expectativa quanto à recompensa recebida da agência que lhe contrata. Fatores internos, externos, organizacionais e pessoais fazem desse sentimento de frustração um balanço, cada hora pendendo para um lado.
Entretanto, é possível buscar indicativos de maior chance de sucesso na sua jornada profissional no mercado publicitário e também, caminhos para as empresas oferecerem condições mais equilibradas e justas de recompensa. É uma via de mão dupla!
Se você está à procura de uma nova posição ou se você quer pensar um pouco em como está o ambiente em que está inserido no momento, os caminhos são semelhantes. Para começar essa jornada de observação e avaliação, tente entender ao menos quatro pontos: plano de carreira, processo de avaliação (mais conhecido como feedback nesse mercado que adora estrangeirismos), equilíbrio entre vida pessoal e profissional e, por último, mas super importante, sua remuneração.
Começando pela sua carreira que deve ser sua maior preocupação e de maior longo prazo. Muitas agências de publicidade não têm um plano de carreira claro para seus funcionários e isso pode fazer com que as pessoas que nela trabalham sintam que não estão sendo desafiadas, que não estão progredindo ou não têm passos claros definidos do caminho que precisa ser percorrido para alcançar seus objetivos. Sem essa informação clara, como resultado, a frustração cresce… e, provavelmente, começará a procurar por outra oportunidade de trabalho.
Se você identificou um lugar de trabalho com plano de carreira e sabe quais os objetivos precisa alcançar para o próximo degrau da sua jornada, é preciso entender como você vai receber as informações necessárias sobre o seu desempenho e que vão permitir que você se desenvolva. Em resumo: como você será avaliado e como você receberá informações sobre o seu desempenho que permitem que você entenda com clareza a sua real situação na empresa. O processo de feedback precisa ser estruturado e fazer parte da cultura organizacional da agência de publicidade. Esse processo é fundamental para que você se mantenha atualizado sobre a sua performance e para que expectativas sejam definidas. É importante saber o que é esperado de você, como está sua entrega, o que pode ser feito para melhorar e o que de bom que você faz deve ser mantido. Além disso, o momento do feedback também serve para que você possa levantar questionamentos e expectativas do seu lado e criar uma conexão (ou uma relação de troca) construtiva com a pessoa que gerencia seu trabalho diretamente. Sem um processo estruturado de feedback, tanto a pessoa quanto a empresa saem perdendo nos seus respectivos crescimentos.
Não menos importante é entender a dinâmica do trabalho dentro da empresa. Equilíbrio ruim entre vida pessoal e profissional é um problema histórico do setor de publicidade, com suas longas horas trabalhadas e horários de trabalho exigentes. Flexibilidade e planos de compensação são importantes para momentos de alta demanda: verifique quais são as opções e busque o cumprimento dos acordos. Vale para os dois lados, sempre. Flexibilidade anda de mãos dadas com responsabilidade de todas as partes envolvidas.
Falar de salários certamente é o tema mais difícil, principalmente porque não há uma cultura no Brasil de conversas transparentes entre os profissionais. Falar sobre dinheiro no Brasil é um tabu e, também por conta disso, a “base de dados” para avaliar sua competitividade salarial no mercado é bem restrita. É importante conectar seus objetivos de remuneração com seu plano de carreira e seu processo de feedback. Mais importante do que monitorar a “grama do vizinho” é saber se o ambiente em que a pessoa está inserida tem condições de atender às expectativas. Se a conversa entre pares é um tabu, as agências têm que buscar a transparência e nivelar as expectativas com suas equipes nos processos de feedback e planos de carreira. Além de disputar talentos em um mercado muito competitivo, as agências ainda concorrem com o mercado que usualmente contrata seus serviços. Não é novidade: clientes das agências acabam por recrutar pessoas dos times que lhes atendiam.
Por isso, não é possível falar em redução do temido turnover e reter seus talentos sem dedicar atenção a esses pontos, nos dois lados da moeda, obviamente! Você, que busca pavimentar sua jornada de trabalho no mercado publicitário e as agências de publicidade que precisam ter processos claros e definidos para nivelar as expectativas das duas partes. Sem a clareza de quais caminhos você pode seguir, sem orientação clara da pessoa que faz a gestão do seu desempenho, a frustração tende a crescer. Cabe também à agência estabelecer um ambiente de trabalho saudável e com uma possibilidade de conversas transparentes sobre remuneração.
*Letícia Fiaschi é Producer Sênior e Flaviz Guerra é Diretor Executivo de Produção & Operações da R/GA Brasil