Enviesamento do Conhecimento
Mafalda sempre nos faz refletir sobre questões tão importantes, e essa tirinha me transportou imediatamente para uma expressão que ouvi recentemente, “knowledge bias” (enviesamento do conhecimento), e que penso sobre isso com certa frequência.
Antes de entrar em detalhes sobre o assunto, é importante explicar de forma mais aprofundada o que isso significa, para que eu não aja de maneira antagonista ao próprio tema.
O enviesamento do conhecimento ocorre quando se assume que as outras pessoas têm o mesmo conhecimento ou informações que você durante uma conversa, ou interação.
Em 1990, Elizabeth Newton, estudante de psicologia na Universidade de Stanford, conduziu um experimento intitulado “maldição do conhecimento”. Ela criou um jogo no qual os participantes atuavam como “tocadores” e “ouvintes”. Os tocadores escolhiam uma música conhecida, como “Parabéns a Você”, e a batiam na mesa, enquanto os ouvintes tentavam adivinhar a música. Das 120 tentativas, os ouvintes acertaram apenas três vezes, uma taxa de sucesso de 2,5%.
Curiosamente, os tocadores previam que os ouvintes acertassem 50% das vezes. Isso ocorreu porque, ao bater a música, os tocadores ouviam a melodia em suas mentes, enquanto os ouvintes apenas escutavam uma espécie de código Morse sendo batida na mesa.
Os tocadores não entendiam por que era tão difícil para os ouvintes adivinharem a música. Isso é porque, uma vez que sabemos algo, como a melodia de uma música, é difícil imaginar não sabendo. Nosso conhecimento nos “amaldiçoa” e temos dificuldade em compartilhá-lo com os outros, porque não conseguimos entender como é não saber.
Tenho refletido muito sobre como o viés do conhecimento é crucial na gestão de projetos, especialmente quando se trata de projetos globais, pois, envolvem uma infinidade de stakeholders e, principalmente, pessoas de diferentes culturas e backgrounds. Portanto, é importante não assumir que todos saibam
completamente tudo da forma que você pensa que eles saibam.
Acredito que isso seja uma das chaves para o sucesso de uma boa gestão de projetos globais na qual precisamos assumir a responsabilidade por uma
comunicação clara, sem esperar que os outros tenham o mesmo conhecimento que nós.
Gosto muito do gráfico abaixo para demonstrar um pouco dessa ideia:
Claro, a ideia desse gráfico se aplica a todos os aspectos da vida, afinal, estamos falando sobre como nos relacionamos, trocamos ideias e lidamos com expectativas. Assim como uma linha reta é o caminho mais curto entre dois pontos, uma comunicação direta e clara é a maneira mais eficaz de garantir que as expectativas estejam claras entre as partes.
Quando se trata de gerenciar projetos globais, há algumas coisas que você pode fazer para evitar cair nas armadilhas desse enviesamento do conhecimento:
Aumente seu entendimento e conscientização desse enviesamento e do impacto que isso possa gerar: seja responsável por entender seu papel e garantir que seus stakeholders estejam cientes das informações que vão ajudar no sucesso do projeto.
Identifique as pessoas envolvidas e as diferenças entre elas: nem todo mundo se comunica e digere informações da mesma forma, e nem todo mundo vem do mesmo background ou cultura que você.
Identifique claramente quais conhecimentos são necessários a serem compartilhados: pratique a escuta ativa durante contato com as pessoas, isso pode ajudar a identificar onde estão os gaps. E claro, é fundamental você ter clareza sobre os objetivos, KPIs e métricas de sucesso para que as pessoas saibam exatamente o que precisa ser alcançado.
Obtenha feedback de indivíduos relevantes: abra espaço para que as pessoas ao seu redor te ajudem a identificar gaps de comunicação.
Quando em dúvida, assuma sempre que existe falta de conhecimento sobre um determinado assunto: reforçar aquela mensagem será sempre mais rápido do que refazer o job do começo.
Esse conceito de comunicação eficaz não é nada novo. Por isso, mesmo que os pontos mencionados pareçam óbvios, é importante sempre nos questionarmos: será que os resultados dos nossos projetos, sejam bons ou ruins, estão relacionados ao quanto investimos na nossa comunicação?
Como gestores de projetos e operações, isso é algo com que lidamos regularmente e que devemos encarar como parte essencial do nosso trabalho.
É como se fosse quase um compromisso cívico verificar constantemente se estamos falhando na comunicação — pois, isso impacta diretamente na eficiência e nos resultados dos projetos, além de influenciar na construção de relacionamentos duradouros e equipes mais eficazes.
Logo, não assuma que o outro saiba o que você sabe e sempre garanta uma comunicação efetiva.
Sejamos responsáveis por aquilo que gostaríamos que as pessoas soubessem.